Singularidades do caminho

caminho-de-pincel

por Elismere Machado


“Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é

ainda vai nos levar além.”

(Paulo Leminski)


Algo nessa frase me lembra Amélie Poulain; personagem vivido por Audrey Tautou no filme francês O Fabuloso Destino de Amélie Poulain. Amélie é uma menina doce e encantadora, mas é sozinha; vive isolada em seu mundo interno. Seu pai, que é medico, não se aproxima para brincar, dar carinho, beijos e elogios. A única aproximação que os dois têm é quando o pai faz exames periódicos na pequena garotinha e escuta seu coração. Amélie fica tão empolgada com a presença do pai que os batimentos cardíacos disparam. O pai, estranhando esses aumentos no pequeno coraçãozinho, conclui que a menina é doente. Com esse “diagnóstico”, priva a linda bonequinha de contato com crianças, escola e tudo o mais. Ah, se ele conhecesse os verdadeiros problemas do coração de sua pequenina filha …

Sua mãe é neurótica e sistemática. Morre de uma forma estúpida e trágica na frente de Amélie. Seu único amiguinho é um peixinho suicida que, de tantas vezes tentar morrer, extingue a paciência dos pais. Estes resolvem jogar o teimoso suicida no rio mais próximo; para tristeza de Amélie.

Com esse “roteiro”, o que esperar do futuro dessa menina? Praticamente, ela não teria “culpa” se, quando crescesse, tivesse uma vida promíscua e marginalizada. Seria quase natural que fosse assim. Seria o esperado. Seria um mau produto da vida. Seria o desenrolar de uma história desgraçada.

Mas ela tem algo diferente. Seus olhos deixam transparecer uma menina frágil, ferida e medrosa, mas que também tem uma bondade latente pronta pra ser revelada. E assim é. O desenrolar da história mostra como Amélie transforma sua vida. Ela não se sujeita a ser a vítima de uma vida que não escolheu ter, mas protagoniza a própria história. Não é só o destino de Amélie que é fabuloso, ela é fabulosa!

Com suas diferenças e manias esquisitas, Amélie se mostra ao mundo de uma forma singular. Vê o que ninguém percebe, faz o que ninguém nota, pensa o que ninguém imagina. Isso a levou longe. Muito longe do que ela mesma sonhou, muito longe do que seria o destino “normal” de sua vida. Não foi criada para ser assim, mas não viveu para ser o que foi criada.

Sua singularidade é o caminho que encontra para fazer outros felizes e, fazendo isso, ser feliz. A história de Amélie, que é fabulosa, mas pode ser uma fábula também, nos desafia a viver a vida sendo nós mesmos e em função do outro, editando as mazelas e desgraças da própria vida. Talvez Leminski tivesse isso em mente quando escreveu essa frase. Ou não.

“Na verdade, a grande diferença é a simplicidade que decorre das desilusões, as quais dão a você o sentido do que seja apenas essencial nas coisas, deixando de lado um monte de coisas que não fazem o essencial se manifestar!” Caio Fábio

Elismere Machado

4 Comentários

  1. brumnad said,

    12 de outubro de 2009 às 11:30

    O filme ‘O fabuloso destino de Amélie Poulan’ é realmente uma obra prima. O futuro de Amélie, que parecia tão provavelmente obscuro, após tantas ‘desgraças’, surpreende ao apresentar Amélie como uma mulher pura, inocente e bondosa. Até quando se apaixona, isso acontece de forma tão delicada, que não transparece nenhuma maldade ou ciúme. A história de Amélie é mesmo uma prova de que podemos ser felizes, independente do que nos parece ter sido ‘traçado’, e que isso só depende de nós mesmos. E, acima de tudo, que vale a pena fazer e plantar o bem.

  2. Du Santana said,

    20 de novembro de 2009 às 17:40

    Sabe que a primeira vez que assisti esse filme eu fiquei com um medo enorme da amélie… eu não teria a coragem que ela teve. ou talvez sim. ^^

    Olha eu “peguei” a imagem desse seu post para por em um post meu, vc se importa?

    Qualquer coisa me manda um comentário para eu por os créditos certinhos se vc aceitar tá?

    see you!

  3. Verania said,

    9 de janeiro de 2010 às 22:35

    Adorei o post. Essa é uma história reveladora e inspiradora. O texto sustenta ainda mais esse meu pensamento.
    Abs

  4. Amanda said,

    19 de setembro de 2012 às 19:52

    De quem é essa pintura?


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